Fadiga por compaixão – o que sente quem cuida


“Criança Doente” – Edvard Munch Pintor norueguês (1863-1944)

Escrito por Maíra Dantas*

 

A dedicação exaustiva à qualquer atividade desempenhada pode levar à fadiga.

O desvelo continuado em acolher, compreender, confortar e consolar outrem poderá levar profissionais da saúde à condição de estresse secundário, conhecida como “fadiga por compaixão”. Curiosamente, a palavra fadiga deriva do latim fatigari que significa fazer desabafar. Enquanto compaixão se refere ao sentimento piedoso de simpatia para com a tragédia alheia, acompanhado pelo impulso altruísta de minorar esse sofrimento, num exercício de compreensão e ternura.

Diferentemente do que muito se apregoa, os profissionais de saúde não são frios ou insensíveis. Ao contrário, sofrem e choram às escondidas, a fim de manter o equilíbrio necessário, aos que precisam de força e apoio.

A pandemia da COVID 19 revelou desconhecimento das rotinas desgastantes desses profissionais por parte dos demais cidadãos, que foram forçados a adotar regras sanitárias, protocolos de segurança semelhantes e a assumir responsabilidades para com os cuidados de terceiros.

Assim, a fadiga da compaixão que era exclusiva de alguns, transformou-se numa doença comum a todos, de gradações variáveis conforme o construto psicoemocional, perdas, dores e rede de apoio em que estão inseridos.

É importante o reconhecimento precoce de que, em alguns casos, o estresse traumático secundário pode alcançar conotação patológica, demandando assistência profissional especializada, suporte psicoterapêutico e medicamentoso. O enfrentamento sério da questão, talvez possa mitigar sequelas psicoemocionais advindas da súbita mudança do padrão social de comportamento, aliada aos medos e inseguranças de um cenário prolongado de incertezas.

Servir é um privilégio; ser servido é também; mas ambos têm custos. Ainda que Programas de Controle Médico de Saúde Ocupacional venham envidando esforços e se desdobrando na tentativa de proteger colaboradores da exposição ao vírus e ao risco de contágio, dificilmente conseguirão blindá-los totalmente de vivenciar situações desafiadoras, no exercício das funções inerentes à assistência.

Bem a propósito, cansaço origina-se do termo náutico campsiare, que significa dobrar a rota, contornar uma ponta de terra com desgaste e riscos adicionais imprevistos.

Por essa razão, torna-se compromisso de cidadania nos dias atuais, investir na difícil e imprescindível busca da sustentabilidade pessoal conceituada sumariamente como capacidade de satisfazer necessidades pessoais presentes, sem comprometer a existência de futuro. Quanto mais investirmos no autocuidado, mais pouparemos outros da condição de cuidadores, trazendo equilíbrio para a alternância inerente à existência, entre cuidar e ser cuidado ao longo da vida.

 

Dra. Maíra Dantas é médica intensivista, especialista em Gestão em Saúde, conselheira federal pelo Estado da Bahia e membro da Câmara Técnica de Bioética e da Comissão de Humanidades do CFM.

 

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