A despersonalização da Medicina


// Luiz Roberto Londres

Ética > Moral > Deontologia > Lei

 

O Juramento de Hipócrates – é aquele que o médico faz no dia da sua formatura. De maneira sucinta, por vezes antiquada, dá as diretrizes gerais do comportamento do médico. Torna-se o primeiro compromisso do médico com a ética pessoal. Traz à sua mente seus deveres em relação aos pacientes, na busca do seu bem e evitando o seu mal.

 

Deixa entender a enorme responsabilidade do médico que tem em suas mãos a vida, a saúde e mesmo as relações pessoais e institucionais daqueles que ele atende. Estabelece os parâmetros que devem reger uma relação desbalanceada a qual Laín Entralgo dá o nome de “quase-díada”. De um lado uma pessoa necessitada e do outro uma pessoa com os conhecimentos para atendê-la e servi-la.

 

A ética pessoal pode ter suas variações em função das diversas culturas, do que elas valorizam, dos seus costumes e de sua história. A esse conjunto damos o nome de moral. É por essa moral que os muçulmanos podem ter quatro esposas e em algumas tribos brasileiras é aceito que se mate um recém-nato com anomalias. Essas situações e muitas outras seriam inadmissíveis na cultura ocidental; mas, para essas culturas é absolutamente natural.

 

A deontologia é o conjunto de normas que dá a diretriz a respeito das subdivisões das escolhas e ações que são moralmente necessárias, permitidas ou proibidas. No caso da Medicina seria o que se dá o nome de ética médica e, a seu conjunto, dá-se o nome de Código de Ética Médica. Esse conjunto de normas evolui junto com a evolução da Medicina, com as novas técnicas, as novas doenças, à nova apreciação de casos e a situações onde o correr e os limites da vida – nascimento e morte – estejam sendo considerados.

 

Finalmente temos a lei que não mais reflete nenhum dos anteriores, mas se propõe a regulamentar a moral da nação onde ela está em vigor. Mesmas culturas, como a cultura ocidental, têm muitas de suas leis conflitantes. E vemos hoje em dia uma pletora de leis e decretos, invadindo campos diversos, legislando sobre situações onde elas não são necessárias e defendendo direitos de categorias sem levar em conta o mal que possam estar fazendo a outras.

 

Isto está acontecendo na Medicina. Considerando-se que a Medicina está composta de normais gerais aplicadas a casos particulares por um lado e, por outro, que a lei é igual para todos, podemos entender os conflitos criados por aqueles que legislam à distância do fato médico. A tentativa de serem estabelecidos protocolos e similares de maneira genérica sem saberem até que ponto eles podem ir, costuma roubar ao médico a aplicação do seu raciocínio clínico para seguirem um manual de maneira automática. A história natural da doença é desprezada em função de sintoma e sinais do momento e a história psico-social do paciente sequer é lembrada.

 

A Medicina assumindo essa roupagem deixará de ser Medicina. Hospitais passam a se assemelhar a linhas de montagem de seres “inanimados”. Consultas médicas passam a ser meros questionários sem levar em conta a interação entre o paciente e o seu médico. O raciocínio diagnóstico é delegado às máquinas sem cérebro e aos laudos dos exames emitidos por profissionais cujas capacidades não são conhecidas. A defesa do paciente contra seus males é substituída pela defesa de si mesmo em relação a possíveis ações judiciais por danos causados aos pacientes.

 

Outra consequência despersonalizante da Medicina é quando direitos de instituições e empresas que se propõe a agir no campo médico e da saúde são defendidos mesmo que à custa dos direitos médicos e, muito mais grave, dos pacientes. Brechas nas leis são procuradas para legitimar ações que costumam ser nefastas. Fornecedores de materiais e medicamentos, intermediários financeiros de todos os tipos – seguros saúde, planos de saúde, cooperativas, etc. – que visam seus interesses financeiros passando por cima dos interesses dos protagonistas do ato médico. Eles, que deveriam servir à Medicina, dela se servem. Com apoio de legislações que podem estar corretas em certas interpretações, mas que podem estar absolutamente incorretas se suas visões forem alargadas.

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* Luiz Roberto Londres é membro da Comissão de Humanidades Médicas do CFM

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