Cautela no uso da ozonioterapia |
Sex, 04 de Janeiro de 2019 14:00 |
José Hiran da Silva Gallo*
Por seis votos a quatro, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu os efeitos da lei que autorizava o uso e a distribuição, no Brasil, da fosfoetanolamina, a chamada “pílula do câncer”. Na mesma sessão de julgamento, em maio de 2016, os ministros mantiveram suspensas as decisões judiciais que obrigavam o Governo a fornecer a substância a pacientes que fizessem esse pedido.
Esse foi o ponto final de um processo que evoluiu por caminhos tortos e pode ser tomado como exemplo máximo dos prejuízos que podem ser causados pela inadequada aproximação do Legislativo com o mundo da ciência. Trata-se de questões técnicas que são indevidamente avaliadas sob um prisma político, que nem sempre observa as implicações de uma medida desse porte sobre a vida e a morte de pacientes.
A decisão do STF atendeu a um pedido da Associação Médica Brasileira (AMB) contra a vigência da lei, aprovada no Congresso Nacional e sancionada pela então presidente Dilma Rousseff. A comunidade médica permitir a vigência daquela regra seria a senha para o aumento de complicações de saúde e óbitos decorrentes do abandono de tratamentos em função de uma droga sem reconhecida eficácia e segurança.
Pouco mais de dois anos depois, o Brasil se vê às voltas com uma situação que caminha para desfecho semelhante. A Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado aprovou por unanimidade o Projeto de Lei (PL) nº 227/17, que autoriza a prescrição da ozonioterapia em todo o País. Como não houve recurso para votação em Plenário, a matéria seguiu para a Câmara dos Deputados.
Ozonioterapia é um procedimento que consiste na aplicação de gases oxigênio e ozônio por diversas vias, como intravenosa ou intramuscular, com objetivo terapêutico. Apesar de praticada em diferentes países, ela ainda carece de garantias de sua eficácia e segurança, as quais não podem ser negligenciadas por profissionais e pacientes.
Ou seja, o PL que tramita no Congresso Nacional pode colocar o cidadão em situação de risco irremediável. Esperamos que os parlamentares escutem os argumentos do Conselho Federal de Medicina (CFM) e dos médicos sobre o tema e entendam a rota equivocada pela qual adentraram, mesmo com as melhores das intenções.
Se insistirem nesse caminho, restará recorrer ao STF para que, mais uma vez, se estabeleça a ordem. Antecipando-se aos fatos, o CFM já expressou, por meio de Resolução publicada no Diário Oficial da União, sua visão sobre o tema.
O documento proíbe aos médicos a prescrição desse tipo de tratamento dentro dos consultórios e hospitais. A exceção pode acontecer em caso de participação dos pacientes em estudos de caráter experimental, com base em protocolos clínicos e critérios definidos pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).
Isso implica em assegurar aos participantes das pesquisas suporte médico-hospitalar em caso de efeitos adversos, a garantia de sigilo e anonimato e a gratuidade do acesso ao procedimento.
Ao tomar essa decisão, o CFM deixa claro que o uso benéfico da ozonioterapia em tratamentos clínicos ainda está longe de ser uma unanimidade positiva. De acordo com a Autarquia, o volume de estudos e trabalhos científicos adequados sobre a prática ainda é incipiente e não oferece as certezas necessárias.
Mais de 26 mil trabalhos sobre esse tipo de tratamento foram analisados, mas nem todos tinham boa amostragem ou dados completos. Para o CFM, esse quadro exige mais pesquisa em busca de conhecimento sobre o tema.
Afinal, logo de início já causa espanto o número de problemas que a ozonioterapia diz curar e tratar. Não há na história da medicina registro de droga ou procedimento contra mais de 200 doenças, algumas delas graves, como hepatite, hérnia, câncer e aids.
Em meio a esse debate, ressaltamos o equilíbrio como tema tratado pelo CFM, que não quer ver um novo episódio, similar ao da fosfoetanolamina, desaguar no Poder Judiciário que, há dois anos, sentenciou em sua decisão sobre o tema: “o Congresso Nacional, ao permitir a distribuição de remédio sem o controle prévio de viabilidade sanitária, não cumpriu com o dever constitucional de tutela da saúde da população”.
* Diretor-tesoureiro do Conselho Federal de Medicina, doutor e pós-doutor em bioética.
* As opiniões, comentários e abordagens incluidas nos artigos publicados nesta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do Conselho Federal de Medicina (CFM).
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Revalidação de diplomas: cuidado internacional com a qualidade da assistência |
Sex, 04 de Janeiro de 2019 13:46 |
Dalvélio de Paiva Madruga*
Em 2019, o projeto de lei que torna uma obrigação para os portadores de diplomas de medicina obtidos no exterior a aprovação em exame nacional de revalidação de diplomas – o Revalida – será tema de grandes debates no Congresso Nacional.
A proposta, apoiada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e outras entidades médicas, assegura um parâmetro técnico – único e isento – para assegurar que tenham direito ao exercício da profissão no Brasil apenas aqueles que comprovarem por meio de testes a posse de competências, habilidades e atitudes esperadas dos médicos.
Engana-se quem pensa que o Brasil inova ao exigir o cumprimento desse requisito. Na maioria das nações europeias e da América do Norte, o médico estrangeiro é bem- -vindo, desde que demonstre que possui o preparo para exercer seu ofício. A preocupação é a mesma: proteger a saúde e a vida dos pacientes que, sem essa atestação, podem ser expostos a risco indevido. No Brasil, o programa Mais Médicos desvirtuou esse processo que busca a qualidade na prática profissional. Na contramão de países desenvolvidos, que aprimoram seus mecanismos de validação, impondo ordem à entrada de formados no exterior, com essa iniciativa, o governo deixou a porta aberta para que milhares de intercambistas passassem a atender sem estar atento a exigências mínimas.
Na Itália, os candidatos precisam apresentar uma lista extensa de documentos, inclusive um atestado de que não respondem a processos ético-profissionais, comprovar o domínio do idioma e passar por diferentes baterias de exames. No Canadá, o zelo não é menor: o país só concede licença plena – que permite o exercício independente da medicina – para os cidadãos canadenses ou imigrantes legais. Dentre os pré-requisitos a serem cumpridos estão: apresentar diploma de médico obtido em uma faculdade listada no diretório da Organização Mundial da Saúde (OMS) e aprovação nos exames nacionais do Conselho Médico do Canadá. No caso dos especialistas, é necessário ter título obtido após avaliação pelo Royal College of Physicians and Surgeons of Canada (RCPSC). No caso do médico de família, é exigida aprovação em teste do College of Family Physicians of Canada.
Para o médico estrangeiro com o objetivo de atuar nos Estados Unidos, não importam os títulos e certificados que leva de seu país de origem. Tampouco a experiência que carrega é levada em consideração. Todos os candidatos precisam vencer uma bateria de exames e fazer uma nova Residência, que pode durar de três a cinco anos. Como esses, vários outros países têm o mesmo rigor no momento de selecionar futuros profissionais. Aqueles que fazem as provas consideram os processos difíceis, mas não acusam sua exigência como exemplos de discriminação ou xenofobia.
Em várias oportunidades, o CFM – e as outras entidades médicas – apresentou esses e outros argumentos que atestam a importância da revalidação de diplomas médicos. Foram reuniões com ministros e audiências públicas no Congresso Nacional, além de outras ações para ressaltar a relevância dessa medida.
Durante as eleições gerais de 2018, essa proposta foi encaminhada a todos os candidatos como uma das reivindicações aprovadas pelo Encontro Nacional de Entidades Médicas (Enem), realizado em junho. Dentre os que receberam o documento está Jair Bolsonaro, que, espera-se, tenha se sensibilizado com esse pleito e possa apoiar sua tramitação, ciente de que ao tornar o Revalida uma lei estará contribuindo para a melhor assistência de todos os brasileiros.
*Conselheiro federal representante dos médicos da Paraíba. É membro das Comissões de Ensino Médico e de Assuntos Políticos.
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Qui, 03 de Janeiro de 2019 17:36 |
Carlos Vital Tavares Corrêa Lima*
Eleito com 55% dos votos válidos, Jair Bolsonaro (PSL) assume a Presidência da República, neste mês de janeiro, com a missão de atender, entre outros pontos, quatro grandes expectativas de seus eleitores: mais segurança pública, mais emprego, combate à corrupção e ordem. Esses são os pilares sobre os quais o então candidato construiu sua campanha.
Logo após a eleição, Jair Bolsonaro anunciou os nomes de seus ministros e, com o apoio da equipe de transição, esboçou as primeiras medidas a serem tomadas pela sua futura gestão. Antes mesmo delas serem implementadas, as primeiras sondagens junto à população, divulgadas no fim de novembro, demonstraram que os anúncios feitos têm despertado otimismo e expectativas positivas entre os brasileiros.
Pesquisa realizada pelo Ibope, a pedido da Confederação Nacional da Indústria (CNI), indica que 75% da população entende que Jair Bolsonaro e sua equipe estão “no caminho certo”. Os números mostram ainda que cerca de dois terços dos brasileiros (64%) têm a expectativa de que o próximo governo será “ótimo” ou “bom”. Para outros 18%, seu desempenho será regular, 14% acreditam que será “ruim” ou “péssimo”, e 4% não responderam. Na avaliação dos analistas, esse fenômeno é comum na delicada relação que se estabelece entre os eleitos e os eleitores. O candidato que vence um pleito costuma receber um “voto de confiança” no início de seu governo, mesmo daqueles que preferiam outros nomes. Será ao longo do mandato que a população consolidará seu veredicto, definindo sua posição de apoio ou crítica.
Certamente, a manutenção dessa percepção positiva resultará de ações que serão tomadas a partir de 2019. Dentre elas, são aguardadas aquelas voltadas à solução da crise enfrentada pela área da saúde no País ao longo dos últimos anos. Após entrevistar 2 mil pessoas em 127 municípios, a pesquisa do Ibope revela que esse é o tema que mais preocupa a população.
Na opinião de 46% dos brasileiros, a saúde é o principal problema a ser enfrentado pelo novo governo. Na sequência, vêm o desemprego (45%), a corrupção (40%) e a segurança pública (38%).
Essa percepção, que dialoga com levantamentos semelhantes realizados em diferentes fases das últimas gestões presidenciais, ressalta a prioridade que o brasileiro atribui à saúde e seu entendimento de que é preciso encontrar, de modo urgente, respostas efetivas para questões como o déficit no total de leitos para internação; a dificuldade de acesso a exames, consultas e cirurgias; e a demora no tempo de atendimento, de longe a principal queixa do paciente usuário do Sistema Único de Saúde (SUS).
A escolha do deputado Luiz Henrique Mandetta para o Ministério da Saúde pode ser entendida como sinal de que um novo tempo está prestes a começar nessa área. Ela manifesta a preocupação do governo de Jair Bolsonaro de ter à frente da Pasta, com um orçamento previsto de R$ 128 bilhões no próximo ano, um nome com conhecimento técnico sobre os diferentes fatores relacionados à assistência e com experiência política para fazer as articulações necessárias para atender os interesses dos envolvidos nesse processo.
As entidades médicas, como têm feito historicamente, estão dispostas a colaborar, com independência e autonomia, com o aperfeiçoamento da saúde no País. Sem amarras partidárias ou ideológicas, poderão oferecer subsídios para que programas, projetos e políticas de saúde sejam criados tendo como objetivos a valorização do ético e competente exercício da medicina e a defesa dos direitos humanos e dos cidadãos. Esse é compromisso dos médicos com a Nação.
* É presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Palavra do Presidente publicada na edição nº 265 do jornal Medicina. Acesse aqui a publicação.
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Fórum de Ortopedia e Traumatologia |
Qui, 06 de Dezembro de 2018 15:34 |
Anastácio Kotzias Neto*
A prática da medicina desperta curiosidade, opiniões diversas e eventualmente discussões. A busca constante por aprimoramento científico pelo médico e a evolução tecnológica na oferta de insumos eficazes na assistência a milhares de pacientes proporcionaram aumento da qualidade e expectativa de vida.
Pela sua importância e necessidade social, é destaque na mídia, trazendo ao debate, por vezes acalorado, as posturas em que os atores se veem envolvidos nas mais diferentes circunstâncias. É necessária e muito oportuna esta abordagem desde que focada na orientação e bem comum.
Inúmeras são as observações a respeito da prática médica. A divulgação de novas descobertas oferece ao leitor a possibilidade de tratar-se com o que lhe apresentam como o “mais moderno”, entretanto são estudos experimentais não disponíveis no nosso meio, e sem ter cumprido os requisitos mínimos de segurança e aplicabilidade determinados pelos órgãos competentes (CEP, Conep, Anvisa).
A evolução guarda relação estreita com a indústria, seja ela farmacêutica ou de insumos, composta por empresas estruturadas, que têm o segundo orçamento de investimento e lucro e veem o mercado como resultado de seus investimentos e pesquisas. Dados do MS/ANS revelam que a implantação de órteses e próteses custaram ao SUS em 2017 R$ 1,25 bilhão. São utilizados em procedimentos cardiológicos e ortopédicos 400 tipos de próteses e órteses. O mercado nacional de dispositivos implantáveis no ano gastou R$ 4 bilhões, e o de órteses e próteses, R$ 20 bilhões.
No âmbito do exercício da medicina, o problema decorre do conflito de interesses estabelecido quando o médico recebe vantagens diretas e/ou indiretas para prescrever determinados produtos, sendo imperativa a necessidade de coibir abusos e irregularidades na prescrição e comércio de órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs).
Os Conselhos de Medicina – em especial o CFM –, atentos ao problema, têm exigido do governo e dos planos de saúde condições de trabalho e remuneração justa e digna para os médicos. É preciso melhorar os honorários médicos e os valores pagos pela Tabela SUS e pelas operadoras de planos de saúde. Essas medidas contribuem para fortalecer o médico contra os avanços de representantes antiéticos da indústria de medicamentos e implantes. Isso evitará denúncias envolvendo representantes da indústria, donos e funcionários de hospitais e médicos.
O I Fórum de Ortopedia e Traumatologia, realizado pela Câmara Técnica de OT do CFM em outubro, reuniu os envolvidos neste cenário para discutir sobre compliance na visão dos Instituto Ética Saúde, Ortopedista e Conselho Federal de Medicina. Temas como “Segunda opinião: solução ou conflito?”, com palestras da Sociedade Brasileira de Coluna e do CFM, e “Material de implante: a quem cabe a escolha?”, com exposições da SBOT, da Anvisa, Operadoras e Ministério da Saúde, justificaram a realização do evento que contou com um plenário repleto e participativo. Pelo apresentado e discutido, podemos concluir que, mesmo disponíveis e interessados, somos pouco ouvidos pelos órgãos responsáveis pelo controle e liberação dos insumos que utilizamos, motivo da nossa insistência enquanto órgão fiscalizador, agora em parceria com a SBOT.
Temos a convicção de que o combate às irregularidades na prescrição e comércio de OPMEs depende de uma ação coordenada envolvendo diferentes segmentos da sociedade. A criação de um escopo legal e de esferas para fixação de valores para os produtos será importante auxiliar para coibir as irregularidades.
Os Conselhos de Medicina estão comprometidos com a defesa da ética no exercício profissional e continuarão a colaborar com as investigações relacionadas às denúncias, na fiscalização de casos suspeitos e na formulação de regras que reforcem as boas práticas em benefício do paciente e respeito ao médico que desempenha seu mister com dedicação e esmero.
* É doutor em Ortopedia e Traumatologia. No CFM, representa os médicos de Santa Catarina.
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Pensando o futuro da saúde |
Qui, 06 de Dezembro de 2018 15:30 |
Jecé Freitas Brandão*
Pesquisa divulgada em junho pelo CFM mostrou que continua alta entre os brasileiros a percepção negativa sobre a saúde no Brasil, tanto na esfera privada quanto pública. A área é vista como péssima, ruim ou regular por 89% da população, e boa parte dessa carga decorre da experiência vivenciada por 150 milhões de pessoas que dependem exclusivamente da rede do SUS para fazer uma consulta, um exame ou uma cirurgia.
Essa insatisfação decorre, sobretudo, do longo tempo de espera para que o cidadão obtenha uma resposta do SUS para sua demanda. Essa é a visão de 24% dos entrevistados. Além desse problema, a população entende que contribuem para a má avaliação a falta de recursos financeiros para o SUS (15%) e sua má gestão administrativa e operacional (12%), assim como a falta de médicos (10%) e a dificuldade para marcar ou agendar consultas, cirurgias e procedimentos (10%), entre outros pontos.
Ao avaliar, de modo específico, o tempo de espera que se destaca nesse ranking, é fácil verificar que, para a população, esse é o maior gargalo na rede pública. Ele é o principal vilão para 82% dos entrevistados que buscam uma consulta, 80% dos que precisam de um exame de imagem e para 79% dos que aguardam uma cirurgia. Infelizmente, a situação tende a se agravar.
No período de coleta dos dados, em maio de 2018, do total de 2.087 entrevistados, 34% aguardavam para fazer uma cirurgia, 32% buscavam uma consulta médica, e 31%, exames. Porém, chama a atenção que o SUS está levando cada vez mais tempo para responder às solicitações.
Em 2014, uma pesquisa do mesmo tipo identificou que 29% dos que haviam pedido exame, cirurgia ou consulta ainda aguardavam um desfecho após seis meses. Em 2018, esse percentual passa a ser de 45%. O mesmo ocorreu com o índice dos que aguardam há mais de 12 meses, que passou de 16%, em 2014, para atuais 29%, praticamente duas vezes mais.
No entanto, um estudo do Datafolha feito a pedido do CFM revela que apesar de ter uma avaliação negativa pela maioria dos entrevistados, o SUS é visto como uma política que deve ser mantida e aperfeiçoada. Ou seja, o brasileiro reconhece sua importância e, se lhe dá nota ruim, não significa que o rejeite.
A valorização do SUS como política social relevante aparece com ênfase na pesquisa. Para 88% dos entrevistados, o Sistema deve ser mantido no País como modelo de assistência de acesso universal, integral e gratuito para os brasileiros, conforme previsto em seus princípios e diretrizes legais. Contudo, a população está atenta e sabe que há um longo caminho a ser percorrido para colocá-lo nos trilhos.
Em primeiro lugar, acredita-se ser necessário fortalecer o financiamento do SUS, conforme explicitam 53% dos entrevistados, que alegam que não há recursos suficientes para atender bem a todos. Contudo, a própria população sabe que o dinheiro renderá apenas se houver boa gestão: 83% acham que as verbas públicas destinas ao Sistema não são bem administradas.
Essa é a opinião da maioria. Para 62%, o SUS não tem gestores eficientes e bem preparados, o que revela uma percepção de incompetência administrativa decorrente, em grande parte, de questões sentidas no cotidiano das unidades de saúde, em todos os níveis de complexidade.
Por exemplo, os brasileiros relatam grande dificuldade de acesso a atendimento e serviços no âmbito do SUS, sobretudo para consultas com médicos especialistas (74%), cirurgias (68%), internação em leitos de UTI (64%), exames de imagem (63%), atendimento com profissionais não médicos, como psicólogos, nutricionistas e fisioterapeutas (59%) e procedimentos específicos (diálises, quimioterapia, radioterapia etc.), com 58%.
Esses altos percentuais apenas materializam o impacto na vida das pessoas da pouca oferta de leitos para internação e UTI, da falta de insumos nas unidades básicas de saúde e da desmotivação dos médicos e outros profissionais da área, que sofrem, tanto quanto os pacientes, com as lacunas em termos de infraestrutura e de inexistência de planejamento nas ações empreendidas.
Como forma de oferecer pistas aos que se apresentam nas eleições de 2018, a pesquisa CFM/Datafolha procurou identificar a expectativa dos brasileiros a respeito da atuação desses candidatos após a posse, se forem vencedores em seus pleitos.
O recado dado de modo assertivo indica que, para fazer frente aos problemas na área, os cidadãos querem medidas que: combatam a corrupção na área da saúde (26%); reduzam o tempo de espera por consultas, exames, cirurgias e outros procedimentos (18%); aperfeiçoem a fiscalização dos serviços na rede pública (13%); fomentem a construção de mais postos e hospitais (11%); e garantam a oferta de melhores condições de trabalho e de remuneração para médicos e outros profissionais da área (9%).
Diante dessa declaração dos brasileiros, o bom candidato – conectado aos interesses coletivos – assumirá compromissos públicos com a defesa do SUS, um dos mais importantes avanços alcançados pela sociedade e que, em 2018, completa 30 anos. Essa é nossa esperança para que melhores dias cheguem.
Evidentemente, esse compromisso não impedirá que o SUS, enquanto política social, passe por um democrático e amplo processo de avaliação. Contudo, ao contrário do que defendem alguns segmentos, esse debate terá um objetivo: desatar os nós da assistência, sem trazer ameaças de extinção ou de mudanças que eliminem o que o SUS oferece de mais moderno: acesso universal, integral e com equidade à assistência.
Atentos aos problemas que afetam a saúde e o bom exercício da medicina, é importante reconhecer o que os números revelam: a saúde não pode ser ignorada pelos candidatos e, para atender os anseios legítimos da população, deve ser tratada com seriedade. É tempo de abandonar os anúncios midiáticos e dar o que os brasileiros cobram: planejamento, mais recursos e boa gestão. Só assim o País terá a saúde que merece, conforme prevê a lei.
* 2º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina.
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