Lei do Ato Médico: peça chave para a proteção dos interesses dos profissionais |
Sex, 12 de Abril de 2019 14:54 |
Sidnei Ferreira*
Com base nos pressupostos da Lei do Ato Médico (nº 12.842/13), o Conselho Federal de Medicina (CFM) tem defendido a profissão de inúmeras tentativas de invasão de competências promovidas por algumas categorias da área da saúde e até por órgãos públicos de gestão.
Para alcançar os resultados esperados, a Comissão Jurídica de Defesa do Ato Médico, criada pelo CFM, assumiu a responsabilidade de coordenar essa estratégia frente aos abusos cometidos. Assim, entidades médicas e Conselhos de Medicina monitoram ameaças e impetram medidas administrativas e judiciais para defender os interesses da profissão e dos brasileiros.
Esse é um esforço contínuo, centrado no Ministério Público e no Poder Judiciário e, portanto, está submetido às regras processuais em vigor, o que implica, em grande parte dos casos, uma tramitação longa, que está sujeita ao esgotamento de todos os recursos. No entanto, mesmo como liminar, cada conquista deve ser motivo de comemoração pelos médicos e suas entidades de representação.
Vale lembrar que um ponto a ser considerado é que as decisões favoráveis, mesmo que provisórias, criam uma cultura no mundo jurídico que, aos poucos, consolida o peso da Lei nº 12.842/13 como parâmetro. Ou seja, cria-se jurisprudência, o que é decisivo nesses embates.
Isso amplia a efetividade das ações de defesa profissional promovidas pelo sistema conselhal, que se preocupa, sobretudo, com o respeito aos limites definidos em lei. Reitere-se que vários magistrados em diferentes instâncias já apontam a ausência de lastro legal para resoluções que têm sido publicadas por outras categorias na expectativa de ampliação de escopo de atuação de seus associados.
Em outras palavras, muitos juízes já perceberam o caminho tortuoso adotado por outros conselhos profissionais. Movidos por interesses de mercado e sem as devidas preocupações com a segurança e o bem-estar dos pacientes que acolhem, essas instituições editam normas administrativas ao arrepio do que é dito expressamente em suas legislações.
Quando as ações contra esse tipo de abuso chegam ao Judiciário, fica claro para os magistrados que as alterações propostas não podem ser implementadas porque as ações pretendidas não constam da lei que rege a atividade profissional específica. Mesmo que as teses prosperem numa primeira fase, não resistirão aos recursos impetrados às instâncias superiores.
Diante disso, fortalecem-se os Conselhos de Medicina e o papel dos médicos, o qual será alvo permanente de defesa e de valorização por suas instituições máximas de representação. Esse cuidado implica atuar nos campos da saúde, da educação, da política e da justiça, dentre outros, para que sua missão seja plenamente cumprida.
Afinal, comprometidos com a população médica, o CFM e os CRMs estarão sempre alertas e ativos para atuar em favor da categoria, utilizando-se de todas as ferramentas que a ética e a legislação oferecem.
*É conselheiro federal efetivo pelo Rio de Janeiro, 2º secretário do CFM, pediatra, professor da UFRJ e secretário-geral da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
* As opiniões, comentários e abordagens incluidas nos artigos publicados nesta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do Conselho Federal de Medicina (CFM).
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Diálogo, vigilância e autonomia na reconstrução do SUS |
Sex, 12 de Abril de 2019 13:28 |
Hermann von Tiesenhausen*
O acumulado de falhas na gestão federal do Sistema Único de Saúde (SUS) aos poucos começa a ser descortinado pelo presidente Jair Bolsonaro. Antes mesmo de assumir seu posto, no Palácio do Planalto, ele abriu a caixa preta do Programa Mais Médicos (PMM), revelando não apenas a desorganização da proposta implantada pela administração Dilma Rousseff, mas também os verdadeiros interesses embutidos nesse acordo de cooperação mediado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas).
Além dos controversos repasses bilionários à República de Cuba, que desde o ano passado passam por um pente fino na Justiça, a nova administração mostrou ainda que a lógica de distribuição dos participantes do Programa, inclusive dos cooperados, não observa a presença de médicos brasileiros registrados nos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs).
Os desmandos permitiram que percentual importante das vagas se concentrassem em es tados e municípios que já contam com uma população médica suficiente para atender suas necessidades. A distorção reforçou a intenção do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que não esconde sua pretensão de revisar esse modelo, para que o País conte, na verdade, com Mais Saúde.
A expectativa da população é grande com relação à lista de tarefas que o novo ministro já anunciou em diferentes oportunidades. Sua simpatia pela criação de uma carreira de estado para os médicos caminha ao lado das críticas explícitas aos chamados planos populares de saúde, defendidos com unhas e dentes por um de seus precursores, o engenheiro Ricardo Barros.
Para as entidades médicas, esses compromissos e muitos outros convergem com as soluções propostas pela categoria ao longo dos anos. Em pouco tempo, no entanto, há muito o que fazer para desarraigar uma histórica desilusão da sociedade brasileira com a saúde pública. Há quase duas décadas, o SUS desponta como calcanhar de Aquiles de todos os governos.
O descontentamento surge novamente em pesquisa divulgada pelo instituto Ideia Big Data, divulgada em janeiro. Segundo levantamento, que ouviu mais de 2,3 mil pessoas, apenas 5% disseram acreditar que o sistema de saúde vai melhorar no primeiro ano do atual governo. Outros 15% acham que será pior e 80% creem que será igual.
As entidades médicas acreditam que mudanças são possíveis. Por isso, têm procurado colaborar com a construção de soluções para alguns problemas crônicos do setor. Entende-se que essa postura colaborativa e participativa não tem ideologia. Pelo contrário, fortalece as instituições e a democracia.
Por isso mesmo, esse envolvimento não impede que os médicos, por meios de seus representantes, continuem atentos e vigilantes para chamar a atenção das autoridades para os contínuos desafios na área da saúde. Ferramentas como a fiscalização e a definição de normas éticas para o exercício da Medicina, como prevê a Lei 3.268/1957, serão usadas não pela simples crítica, mas para propor a mudança positiva, apresentando o diagnóstico de como vai a assistência, indicando os tratamentos possíveis.
A construção efetiva e real do SUS, balizador de todo o sistema e que acaba de completar 30 anos, passa pela transparência e pelo respeito à percepção e às necessidades dos cidadãos, entre eles os médicos. Aliás, são essas constatações, muitas delas reveladas em relatórios e pesquisas conduzidas pelo CFM, que poderão pautar as políticas públicas e as decisões dos gestores nas três esferas.
* É conseheiro federal representante do estado de Minas Gerais e ocupa o cargo de 1º secretário do CFM.
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Por mais qualidade na educação |
Ter, 09 de Abril de 2019 18:10 |
Carlos Vital Tavares Corrêa Lima*
O Programa Internacional de Avaliação de Alunos (em inglês, Programme for International Student Assessment – Pisa) é uma rede mundial de avaliação de desempenho escolar cuja primeira edição aconteceu em 2000.
Considerado um dos maiores referencias internacionais para o ensino, é coordenado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para estimular o aperfeiçoamento de processos e de políticas educacionais entre os países participantes.
A metodologia empregada prevê que, a cada três anos, alunos de 70 países participem de exames de leitura, matemática e ciências. A intenção é mensurar a qualidade do ensino oferecido a partir dos resultados obtidos, e com isso orientar a adoção de melhorias na gestão da área. Apesar de avanços registrados, o Brasil continua distante dos países que estão nos primeiros lugares desse ranking. Em 2000, quando o Pisa começou a ser aplicado, o País ficou em último lugar. Na edição mais recente, cujo resultado foi divulgado em fevereiro, ficou na 63a posição, mantendo-se no grupo com desempenhos menos consistentes.
Para o Pisa, o resultado confirma a necessidade de o País repensar, urgentemente, suas propostas para a educação. Conforme apontam os analistas, é importante alinhar metas claras de ação para permitir uma escalada rumo a uma melhor classificação.
Como contribuição, o relatório do Pisa traz aos governantes brasileiros exemplos a seguir com base no êxito alcançado por experiências internacionais. Como o Programa alerta, não se trata de fazer uma cópia do que deu certo, mas de se inspirar nas soluções adotadas para o Brasil encontrar seu próprio caminho.
Da América Latina vem a primeira referência. Mesmo despedaçada pela guerra e com grandes disparidades sociais, no último Pisa a Colômbia ultrapassou o desempenho do Brasil, assumindo o 58o lugar. Seu sucesso decorreu de duas decisões governamentais.
Por um lado, procurou-se assegurar que recursos para educação chegassem às regiões menos desenvolvidas, corrigindo-se desmandos administrativos e evitando-se a corrupção. De forma complementar, os professores passaram a contar com remuneração mais atraente e um sistema de recompensa na carreira baseado em objetivos mensuráveis.
No Canadá, enquadrado pelo Pisa entre os dez melhores classificados, o reconhecimento e a valorização dos recursos humanos se tornaram políticas de Estado. Para manter a qualidade do seu ensino, o governo canadense garante aos educadores acesso regular a cursos de aprimoramento e uma política de salários justos, que hoje ficam, em média, em R$ 20 mil por mês para os que atuam na rede pública.
Por sua vez, o Japão demonstra o impacto positivo das avaliações regulares e sistemáticas, cujos resultados ajudam a fazer um diagnóstico da situação e a redefinir políticas específicas. Após o Pisa de 2006, quando os japoneses caíram no ranking, comparando-se sua posição na edição anterior do exame, o governo local anunciou um pacote de medidas para enfrentar as deficiências encontradas. Três anos mais tarde, a performance ideal voltou.
Em síntese: valorização profissional, mais investimentos, melhor gestão, criação de carreiras de Estado e implementação de avaliações de desempenho. Com isso, seria possível melhorar a educação brasileira, com consequentes resultados na área da saúde.
Assim, com medidas simples, o mundo mostra ao Brasil que as transformações capazes de trazer cidadania e influenciar o futuro de uma nação dependem apenas de vontade política para se tornarem realidade.
Palavra do Presidente publicada na edição nº 288 do jornal Medicina. Acesse aqui a publicação. |
2018: ética e transparência nas ações do CFM |
Sex, 08 de Março de 2019 17:19 |
Carlos Vital Tavares Corrêa Lima*
O Conselho Federal de Medicina (CFM) é uma autarquia pública federal com atribuições de fiscalização e de normatização da prática médica previstas na Lei nº 3.268/57. Inicialmente, sua competência se limitava ao registro profissional do médico e à aplicação de sanções éticas por descumprimento a normas previstas em resoluções específicas e no Código de Ética Médica.
No entanto, nas últimas décadas, inovações tecnológicas e mudanças nos cenários políticos e das relações em sociedade fizeram com que o Brasil e a categoria médica mudassem. Em sintonia com esse contexto, o papel do CFM acompanhou essa transformação, fazendo com que a autarquia assumisse novas responsabilidades.
Atualmente, o trabalho do CFM extrapola as questões relacionadas somente às posturas éticas e técnicas na prática profissional, incluindo também no rol de suas atividades ações nos campos político e institucional, sempre em defesa da saúde, da população e da categoria.
No currículo do CFM, acumulam-se lutas em favor de políticas públicas de saúde dignas e que agreguem à assistência no País atributos como segurança, qualidade e eficácia. Nesse sentido, deve-se destacar a interlocução com gestores de diferentes ministérios, em especial os da Saúde e da Educação, e com senadores e deputados federais.
Nessas oportunidades, com o empenho de seus conselheiros, o CFM busca sensibilizar cada um desses interlocutores para que assumam posição favorável com relação a medidas que atendam às preocupações dos médicos e da população. Desse modo, reuniões de trabalho e audiências públicas são espaços fundamentais onde argumentos dos profissionais são detalhados e defendidos.
Além dessas ações, a proteção do ato médico configura preocupação constante da autarquia, que tem desenvolvido estratégias para essa luta permanente.
Por meio de inúmeras ações na Justiça, o CFM tem enfrentado a tentativa de invasão das competências exclusivas da medicina, que estão previstas na Lei nº 12.842/13. É uma reação às resoluções administrativas de conselhos de outras categorias que tentam ampliar o escopo de suas atuações sem amparo legal.
Várias dessas tentativas foram barradas por decisões do Judiciário, algumas delas por tribunais superiores. Contudo, o CFM sabe que este trabalho deve ser constante, exigindo-se vigilância permanente e uma equipe ágil para responder com tempestividade os abusos, utilizando-se ainda da possibilidade de apresentação de recursos nas esferas judiciais competentes, quando necessário.
Finalmente, cabe ainda destacar que o Conselho Federal de Medicina, bem como seus 56 conselheiros (efetivos e suplentes), tem na transparência de seus atos, inclusive de gestão, uma prática elogiada até mesmo por importantes órgãos públicos de controle e de fiscalização, como o Tribunal de Contas da União, que em seu Acordão nº 2.513/16, fez menção elogiosa ao trabalho realizado pelo CFM.
Assim, o zelo, o rigor e a responsabilidade estão presentes na rotina do CFM para que sua missão institucional seja alcançada. Em 2018, isso não foi diferente, segundo os números, dados e informações aos quais o leitor terá acesso nesta edição do jornal.
Certamente, nos anos que virão, esse modo reconhecidamente ético e transparente com o qual a autarquia tem se portado ao longo dos anos permanecerá, mantendo o Conselho Federal de Medicina firme em sua trajetória, sempre com lastro na legalidade e na verdade.
* É presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Palavra do Presidente publicada na edição nº 287 do jornal Medicina. Acesse aqui a publicação.
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A resolução do CFM sobre telemedicina deve trazer avanços à saúde do país? |
Seg, 18 de Fevereiro de 2019 14:27 |
Mauro Luiz de Britto Ribeiro*
SIM
A telemedicina foi implantada com sucesso em países desenvolvidos para atender a locais remotos ou de difícil provimento, sendo inimaginável planejar políticas de saúde sem esse instrumento.
O Conselho Federal de Medicina, com outorga legal para normatizar a medicina no Brasil, publicou a resolução nº 2.227/18, prevista para entrar em vigor em três meses. No período, o CFM envolverá médicos e outros segmentos em seu aperfeiçoamento, e uma consulta pública já foi aberta para contribuições.
Com a resolução, espera-se oferecer aos brasileiros instrumento semelhante ao de países desenvolvidos. Será um divisor de águas na medicina do Brasil ao normatizar a telecirurgia e reconhecer a teleconsulta no suporte ao atendimento presencial do médico.
Houve reações à norma. As críticas têm sido analisadas pelo CFM, em sua maioria dissociadas do seu fulcro. Inúmeras publicações foram feitas com acusações de falta de transparência na elaboração do documento; associação de conselheiros com partidos políticos; e interesses espúrios articulados com grupos privados. Tais colocações não contribuem com o aperfeiçoamento do documento e são totalmente fora de propósito.
No entanto, há críticas pertinentes sobre três pontos: definição de área remota, custo de implantação do sistema e condições em que a teleconsulta é permitida.
Em relação ao conceito de remoto, a resolução se refere às áreas distantes, com municípios hipossuficientes, como na Amazônia ou sertão nordestino. Para o CFM, esse ponto deve ser realmente mais bem esclarecido.
Sobre os custos, fala-se de valores de implantação da telemedicina nos consultórios muito superiores aos reais e ignora-se que a certificação digital nível NGS 2, citada no documento, atende a uma exigência legal.
Com respeito à teleconsulta, a norma fixa que ela pode ser feita em qualquer localidade, desde que com a concordância do paciente e após primeira consulta presencial obrigatória.
Os atendimentos à distância ocorrerão em, no máximo, 120 dias, quando se exige nova consulta presencial com o mesmo médico.
Em regiões remotas, e apenas nessa condição, a resolução permite que a primeira consulta seja de modo virtual, com presença do médico numa ponta e paciente na outra, acompanhado por profissional de saúde. Isso permite ao cidadão desassistido acesso ao médico, poupando-o de ir a outra localidade.
Deve-se enfatizar que o papel do profissional de saúde a auxiliar o médico nesse tipo de teleconsulta é igual ao do que está em consultórios ou hospitais. Atuará para a consulta ser realizada de forma plena e posteriormente orientará o paciente conforme as determinações do médico.
Ressalte-se: o profissional de saúde na região remota não formulará hipótese diagnóstica nem prescreverá tratamento, que são atos de responsabilidade do médico.
O mundo se desenvolve tecnologicamente de maneira nunca vista na história. A medicina é uma das áreas preferenciais desse desenvolvimento, o que nos tira da zona de conforto e exige a reformulação de conceitos.
Gostemos ou não, a telemedicina já é realidade no país, feita atualmente de maneira desregrada, atendendo a grupos privados, com interesses econômicos.
Cabe ao CFM regulamentar a telemedicina, sem receio de a tecnologia interferir na relação de confiança médico-paciente, pilar sagrado da medicina, que independe de encontro presencial.
* É primeiro vice-presidente do Conselho Federal de Medicina.
Artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, em 16/02/2019. |
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